quinta-feira, 2 de julho de 2020

PANDEMÔNIO, EDUCAÇÃO E BIOPOLÍTICA

Reflito sobre o quadro atual do (des)governo como uma sucessão de desastres, derivados da falta de planejamento. 

Nunca houve debate. Nunca houve um plano de governo apresentado antes das eleições. Nunca houve. E ainda, não há. Só desmantelo. E o desmantelo é irremediável e é sempre culpa de alguém que não ele mesmo - o próprio (des)governo.

Aliás, há um único plano - ou melhor, sonho: a destruição sistemática de um “inimigo” (uma suposta Esquerda política - “suposta”, uma vez que nenhum partido político pode manter um purismo; - aliar-se aos partidos de centro é parte do jogo político para, simultaneamente, manter a governabilidade). 

Essa mesma “Esquerda” estaria, na mesma lógica da suposição, sendo criada repetidas vezes - o tal do "discurso", - e seu pensamento também “aceso” nas ideias do demônio (!!!) - um tal senhor  Freire, confundido com as fotos de outro Paulo, de sobrenome Coelho (!).

As ideias revolucionárias deste senhor seriam reverberadas em práticas catedráticas, em quaisquer instituições de ensino, principalmente nas UFs; assim, elas precisam de exorcismo, já que essa Esquerda demoníaca precisa da benção de pastores e bispos neopentecostais que compõem, curiosamente, alas evangélicas do governo. Além de desafiarem a constitucionalidade do Estado laico, elas somam o Criacionismo às bandeiras contra as Universidades, lugares pecaminosos que produzem Ciência.

Exemplo da perseguição de professores e sua liberdade de cátedra é o afundamento medieval dos avanços pedagógicos na lama do “Escola Sem Partido” - que é, paradoxalmente e inextrincavelmente, um projeto político-partidário. Um de seus derivados projetos, em nível estadual, sugeriu a possibilidade de aulas serem registradas/filmadas, no maior exemplo de panóptico foucaultiano, vigilância que cercearia  o professor em sua práxis de incitar a reflexão junto aos discentes-sujeitos-cidadãos.

Dentro do quadro político que se desenha, os profissionais que exercem as ditas áreas “não-prioritárias”, definidas na mais nova BNCC são, justamente, os que questionam as práticas antidemocráticas e desastrosas, que flertam com o autoritarismo, segregação racial, supremacia branca e outras mazelas que derivam mesmo de inspiração em um bandoleiro que se autointitula filósofo - uó de Carvalho - que sequer completou seu TCC por incapacidade intelectual. Mas o tal  astrólogo (sim - astrólogo) é uma espécie de mentor intelectual do governo.

Além das suas habilidades em proferir palavrões, ele coaduna com a perseguição do mesmo inimigo, tão poderoso que teria sido responsável por todos os problemas brasileiros, inclusive, pessoais e imediatos de alguns cidadãos, evidenciados em frases, muitas vezes, proferidas pela elite branca:
“O PT destruiu minha vida!” 👩🏻👱🏻‍♂️
 Supostas fábricas de inimigos para uma ideologia descabida e um governo sem planejamento e organização, elas sofrem ataques em meio a tiroteios dirigidos aos inimigos em toda parte: aparelhadas, segundo o pensamento persecutório, as Universidades merecem ser extintas - ou devidamente transformadas em centros de treinamento exclusivos  para o trabalho, em prol do capital e do bem-estar neoliberal, livre de críticas e de sujeitos pensantes e cheios de mimimi.

Estamos todos em guerra contra (ou com?) um inimigo-vírus invisível. Mas a (bio)política de alguns governos - onde o Brasil dá exemplo, movido pelo negacionismo da existência de um vírus mortal - pronuncia as identidades das vítimas: as minorias, que atolam hospitais e morrem, aos montes, enterradas em valas rasas, invisíveis, com o auxílio de contagens de óbitos por perfis sócio-econômicos decretadas “desnecessárias”, no intuito de camuflar a falta de planejamento, falta de organização, ausência de competência - e um vácuo emblemático de um Ministro da Saúde.

Enquanto isso, uma voz de fundo, afastando de si a responsabilidade, palavras desumanas e desrespeitosas de tom fundamentalista religioso - em claro discurso de naturalização do horror:

“- [...] mas... Todo mundo morre!”. Bozo.

...e a banalização da morte, em:

“Covid-19 trouxe está trazendo uma morbidez insuportável, não tá legal”. 

Regina Duarte, atriz que ficou conhecida nacionalmente como "a namoradinha do Brasil" e ex-secretária da Cultura, proferiu a frase acima em entrevista para o programa CNN 360 por Reinaldo Gottino e Daniela Lima, publicada em 07 de maio de 2020:

Disponível em: <https://youtu.be/v9gLHrP7RNw>. Acesso em 02 jul.2020.

"Nestes tempos de incertezas devemos recuperar a capacidade que os seres humanos têm de indignar-se diante de todas as formas de violência e de humilhação. O direito à indignação é um dos mais nobres e humanistas dos valores fundamentais da democracia."
 CARNEIRO, Maria Luíza Tucci, em: "Da era da pós-modernidade à era pós-pandemia". Jornal da USP, 09 jul.2020. Disponível em: <da-era-pos-modernidade-a-era-pos-pandemia>. 

 


Trazido pelas elites que transitavam livres intercontinentalmente, o Covid-19 se instalou, e fez “festa” nos leitos das UTIs de hospitais não equipados devidamente, por conta da corrupção. Corpos pobres, muitos e diversos, ao redor do mundo. No Brasil, não se trata de guerra: agora, a contaminação é necropoliticamente um processo de genocídio desferido - principalmente - aos invisíveis socialmente.
Agora, ele age em via de mão dupla: extingue a possibilidade do encontro e desmantela - pela ameaça de morte -  manifestações contra o governo. Ainda, reforça o neoliberalismo capitalista, excluindo digitalmente o pobre do acesso à Educação.



Em contrapartida, professores, nós, assustados, aturdidos e impotentes, vemos tudo acontecendo por telas. E somos forçados a demonstrar que estamos atuando e produzindo, dentro de uma lógica de redes privadas de ensino, em impossível modelo EaD. Educação para todXs? 
É o fatal “tiro no pé”...

Desabafo. Escrevo/digito - e choro.

Antes agentes de transformação do mundo com nossa modesta contribuição na promoção de reflexão junto aos nossos discentes, hoje, andamos de mãos dadas para um corredor estreito, que leva para um lugar onde só alguns são permitidos: os que têm condições de acesso.

Reflita: Hoje, quem é que morre e quem, de fato, mata?

“Tamos juntos”, apesar da distância. Lembrem de  movimentos como a Primavera Árabe, e, recentemente, a revolta pelo assassinato de George Floyd - totalmente disparada digitalmente. Quem sabe a tecnologia, mais uma vez, pode nos acodir - ou nos juntar, realmente?

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